"Toda gente está com muito medo de que o país seja invadido pela árvore. Absurdo! Em primeiro lugar, Portugal, pelo seu clima e pela natureza do solo, é, fora um ou outro raro lugar, o país da árvore. Então de que é que as pessoas estão, os melhores estão com medo, não é da árvore, é de certas árvores.
Se, por exemplo, o mundo continuasse consumindo muito azeite, os portugueses achariam muito bem que a oliveira fosse plantada em Portugal, quanto mais oliveiras houvesse, mais azeite se podia vender. Simplesmente, o mundo hoje não está comendo azeite, tem outros óleos, melhores para a saúde que o azeite, embora não tão gostosos, mas melhor para a saúde e é isto que se vai fabricar, evidentemente.
Então eles o que querem? Houve agora um Congresso a que vieram representantes da Finlândia e de outros países e tal, que já sabem o que querem fazer de Portugal - querem fazer um país da árvore. De que árvore? Pinheiros - madeira para construção, para tudo o que for preciso fazer de não grande importância e não grande resistência; eucalipto - para papel; choupo - para fazer fósforos, embora já haja fósforos feitos de papel, parece que de madeira são melhores.
Por exemplo, grande parte de região de Mondego, das planícies do Mondego, lá para o lado da Figueira da Foz e Coimbra, já está sendo plantada de choupo para os fósforos, a sociedade dos fósforos está tomando conta daquela coisa.
E há eucaliptos, bem, e já estão a dizer, nesse Congresso, que a grande coisa para Portugal era ser uma fábrica de massa de papel. Muito bem. Diz-se pois: massa de papel, poluindo o rio e com cheiro que tem - é pois, verdade. Mas porque é que a massa de papel polui o rio? Porque com a mira de lucro, com o ardor de ganhar mais dinheiro, não se aplica nenhuma das coisas que se poderia aplicar para não haver poluição nenhuma. É, se o ar está envenenado por ácidos e se as águas estão todas manchadas, de maneira que os peixes morrem, é porque os donos das fábricas, as empresas sem nenhuma espécie de consciência do geral, o que querem é acumular lucro e investir, fazer fábricas maiores, não porque não tenhamos já à nossa disposição todos os meios necessários para que isso não suceda no mundo, para que o mundo não se suje.
Há maneiras de limpar as fábricas.
Por outro lado, a fabricação de papel pode portanto ser domesticada e podemos fornecer o papel para os outros escreverem se quiserem. Não é que tenha uma grande paixão por ver o mundo ilustrado de revistas idiotas e de jornais mais idiotas ainda, mas isso não quer dizer que o jornal ou a revista não possam servir para coisas que não são idiotas."
Agostinho da Silva, inédito
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